quarta-feira, 1 de julho de 2009

Canto V - O gigante Adamastor


O canto V, episódio do gigante Adamastor

Se analisado do ponto de vista histórico veremos que significa a superação do medo que os portugueses tinham do “Mar Tenebroso”.Adamastor, o gigante, nada mais é do que uma alucinação criada na mente do povo luso (que acreditava que no mar moravam monstros terríveis), e quando eles conseguem derrotar o gigante, eles se glorificam não pelo gigante, mas pelos medos que foram vencidos. Já se olharmos do ponto de vista lírico é um dos pontos altos do poema já que retoma os dois temas constantes da lírica: o amor impossível e o amante rejeitado. Também é muito importante porque é nele que se concentram as grandes linhas da epopéia:
1. O real maravilhoso, representado pela dificuldade que os portugueses tinham de passar pelo Cabo das Tormentas
2. A existência de profecias, representada pela história de Portugal
3. Lirismo, que é representado pela história de amor, que continuará no canto da Ilha dos amores.
4. É além de tudo um episódio trágico, que envolve amor e morte.
5. O episódio possui caráter épico porque nele os portugueses vencem os quatro elementos fundamentais (ar, fogo, terra, água).


Introdução (37-38)
Já na primeira estrofe do poema pode-se observar a chegada de algo não esperado. Este algo seria uma nuvem que escurece os ares acima da cabeça dos navegantes, dando fim à prosperidade da viagem.

“Porém já cinco sóis eram passados
Que dali nos partíramos, cortando
Os mares nunca doutrem navegados,
Prosperamente os ventos assoprando,
Quando uma noite, estando descuidados
Na cortadora proa vigiando,
Uma nuvem, que os ares escurece,
Sobre nossas cabeças aparece.”


A nuvem recém-surgida vinha carregada demais para ser confundida com uma simples tempestade marinha, e o primeiro a perceber isso é Vasco da Gama, que pergunta à tempestade o que ela era.

“Tão temerosa vinha e carregada,
Que pôs nos corações um grande medo;
Bramindo, o negro mar de longe brada,
Como se desse em vão nalgum rochedo.
"Ó Potestade (disse) sublimada:
Que ameaço divino ou que segredo
Este clima e este mar nos apresenta,
Que mor cousa parece que tormenta?” ”


Estrofes 39-48
A 39º estrofe é apenas uma descrição do que aparece logo em seguida no mar para Vasco da Gama. O gigante Adamastor. Suas feições não eram nada bonitas, seus cabelos eram cheios de terra, seus dentes eram amarelos e sua postura esbanjava maldade.

“Não acabava, quando uma figura
Se nos mostra no ar, robusta e válida,
De disforme e grandíssima estatura;
O rosto carregado, a barba esquálida,
Os olhos encovados, e a postura
Medonha e má e a cor terrena e pálida;
Cheios de terra e crespos os cabelos,
A boca negra, os dentes amarelos.”


Na 40º estrofe a descrição sobre o gigante continua, porém a ênfase desta vez vai para a sua medonha voz que provoca tremores extremamente profundos nos navegantes, que já haviam se espantado com o tamanho da criatura.

“Tão grande era de membros, que bem posso
Certificar-te que este era o segundo
De Rodes estranhíssimo Colosso,
Que um dos sete milagres foi do mundo.
Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso,
Que pareceu sair do mar profundo.
Arrepiam-se as carnes e o cabelo,
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!”


Na estrofe 41 o gigante conversa com os portugueses e diz que eles são ousados e que sua primeira meta é a glória particular, sendo a maior prova disso que eles haviam chegado nos confins do mundo. Outro fato destacado nessa estrofe é que as águas que o gigante há tanto tempo guardava nunca haviam sido navegadas por outros.

“E disse: "Ó gente ousada, mais que quantas
No mundo cometeram grandes cousas,
Tu, que por guerras cruas, tais e tantas,
E por trabalhos vãos nunca repousas,
Pois os vedados términos quebrantas
E navegar nos longos mares ousas,
Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,
Nunca arados d’estranho ou próprio lenho:”


Na estrofe 42, o “grande” ordena que os portugueses ouçam quais serão as conseqüências que eles sofrerão por terem atravessado o mar, feito que até então não havia sido feito por ninguém.


“Pois vens ver os segredos escondidos
Da natureza e do úmido elemento,
A nenhum grande humano concedidos
De nobre ou de imortal merecimento,
Ouve os danos de mi que apercebidos
Estão a teu sobejo atrevimento,
Por todo largo mar e pola terra
Que inda hás de sojugar com dura guerra.”


Na estrofe 43 o gigante prossegue com as conseqüências que os portugueses sofrerão. Ele diz que todos os que tentarem fazer a viagem que Vasco da Gama está fazendo, terão o Cabo das Tormentas como inimigo. A primeira armada a qual ele se refere no texto é a de Pedro Álvares Cabral, cujo dano (naufrágio) foi maior que o perigo, já que os navegantes foram surpreendidos.


“Sabe que quantas naus esta viagem
Que tu fazes, fizerem, de atrevidas,
Inimiga terão esta paragem,
Com ventos e tormentas desmedidas!
E da primeira armada, que passagem
Fizer por estas ondas insufridas,
Eu farei d’improviso tal castigo,
Que seja mor o dano que o perigo!”


Na estrofe 44, ainda com ameaças, porém, estas, mais assustadoras, Adamastor diz que se vingará ali mesmo do seu descobridor, Bartolomeu Dias, e que outras embarcações portuguesas serão destruídas por ele. Ele ainda promete que o menor mal a se temer será a morte.

“Aqui espero tomar, se não me engano,
De quem me descobriu suma vingança.
E não se acabará só nisto o dano
De vossa pertinace confiança:
Antes, em vossas naus verei, cada ano,
Se é verdade o que meu juízo alcança,
Naufrágios, perdições de toda sorte,
Que o menor mal de todos seja a morte!”


Na estrofe 45, cita-se D. Francisco de Almeida (primeiro vice-rei da Índia) e sua vitória sobre os turcos. O gigante ainda continua a esbanjar perigo.


“E do primeiro ilustre, que a ventura
Com fama alta fizer tocar os céus,
Serei eterna e nova sepultura,
Por juízos incógnitos de Deus.
Aqui porá a turca armada dura
Os soberbos e prósperos troféus;
Comigo de seus danos o ameaça
A destruída Quíloa com Mombaça.”


Nesta estrofe (46) o gigante cita a desgraça da família de Manuel de Sousa Sepúlveda, cujo destino será tenebroso: depois de um naufrágio, sofrerão muito.


“Outro também virá, de honrada fama,
Liberal, cavaleiro, enamorado,
E consigo trará a fermosa dama
Que Amor por grão mercê lhe terá dado.
Triste ventura e negro fado os chama
Neste terreno meu, que, duro e irado,
Os deixará dum cru naufrágio vivos,
Pera verem trabalhos excessivos.”


Na estrofe 47 ele continua a contar a história de Manuel, dizendo que seus amados filhos morrerão de fome e que sua esposa após andar nas areias do deserto, será violentada por africanos.


“Verão morrer com fome os filhos caros,
Em tanto amor gerados e nascidos;
Verão os Cafres, ásperos e avaros,
Tirar à linda dama seus vestidos;
Os cristalinos membros e preclaros
À calma, ao frio, ao ar verão despidos,
Despois de ter pisada longamente
Cos delicados pés a areia ardente;”


Ainda com a história da família de Manuel, lê-se na estrofe 48 que os sobreviventes do naufrágio verão Manuel e sua esposa ficarem num mato quente e inóspito, e mais tarde, eles morrerão juntos.


“E verão mais os olhos que escaparem
De tanto mal, de tanta desventura,
Os dous amantes míseros ficarem
Na férvida e implacábil espessura.
Ali, despois que as pedras abrandarem
Com lágrimas de dor, de mágoa pura,
Abraçados, as almas soltarão
Da fermosa e misérrima prisão.”


Estrofe 49 (Transição)
O gigante continuaria fazendo as previsões na estrofe 49 se Vasco da Gama não o interrompesse perguntando quem era aquela figura maravilhosa. O monstro responderá com voz pesada porque relembraria seu triste passado.

“Mais ia por diante o monstro horrendo
Dizendo nossos fados, quando, alçado,
Lhe disse eu: - Que és tu? Que esse estupendo
Corpo certo me tem maravilhado!
A boca e os olhos negros retorcendo
E dando um espantoso e grande brado,
Me respondeu, com voz pesada e amara,
Como quem da pergunta lhe pesara:”


Estrofes 50-59
Na estrofe 50, o gigante se apresenta: ele é o Cabo Tormentoso, nunca conhecido pelos geógrafos da Antigüidade, última porção de terra do continente africano, que se alonga para o Pólo Sul, extremamente ofendido com a ousadia dos portugueses.


“Eu sou aquele oculto e grande Cabo
A quem chamais vós outros Tormentório,
Que nunca a Ptolomeu, Pompônio, Estrabo,
Plínio e quantos passaram fui notório.
Aqui toda a africana costa acabo
Neste meu nunca visto promontório,
Que pera o Pólo Antártico se estende,
A quem vossa ousadia tanto ofende.”


Na estrofe 51, o gigante conta aos navegantes que ele era um dos Titãs (gigantes que lutavam contra Júpiter e que sobrepunham montes para alcançar o Olimpo), porém, ele, ao contrário dos outros, buscava a armada de Neptuno nos mares.


“Fui dos filhos aspérrimos da Terra,
Qual Encélado, Egeu e Centimano;
Chamei-me Adamastor e fui na guerra
Contra o que vibra os raios de Vulcano;
Não que pusesse serra sobre serra,
Mas conquistando as ondas do Oceano,
Fui capitão do mar, por onde andava
A armada de Neptuno, que eu buscava.”


Na estrofe 52, Adamastor fala sobre um sentimento mais profundo: o amor. Conta que um dia viu Tétis nua na praia e se apaixonou por ela, que passou a ser o seu “objeto” de desejo. Por Tétis, ele desprezou todas as outras deusas. Foi por ela também, que ele cometeu a loucura de lutar contra Neptuno.


“Amores da alta esposa de Peleu
Me fizeram tomar tamanha empresa;
Todas as Deusas desprezei do Céu,
Só por amar das águas a princesa;
Um dia a vi, coas filhas de Nereu,
Sair nua na praia e logo presa
A vontade senti de tal maneira,
Que inda não sinto cousa que mais queira.”


Na estrofe 53, o gigante demonstra certa “fragilidade”. Além do sentimento de amor, ele agora revela que não gosta de si do jeito que é. Por se achar feio, ele pensa que jamais poderia conquistar Tétis , dona de tamanha beleza, pela aparência e resolve então conquistá-la por meio da guerra. Ele manifesta sua intenção à Dóris (mãe de Tétis) que ouve da filha a seguinte resposta: “como poderia o amor de uma ninfa, aguentar o amor de um gigante?”


“Como fosse impossíbel alcançá-la
Pola grandeza feia de meu gesto,
Determinei por armas de tomá-la
E a Dóris meu caso manifesto.
De medo a Deusa então por mi lhe fala.
Mas ela, cum fermoso riso honesto,
Respondeu: - Qual será o amor bastante
De ninfa, que sustente o dum Gigante?”


Na estrofe 54, ainda se conta a história de Tétis. Ela, querendo livrar o oceano da guerra, tenta solucionar o problema com dignidade. O gigante, que a esta hora já estava cego de amor, não consegue enxergar que as promessas que Dóris e sua filha lhe faziam eram falsas.


“Contudo, por livrarmos o Oceano
De tanta guerra, eu buscarei maneira
Com que, com minha honra, escuse o dano.
Tal resposta me torna a mensageira.
Eu, que cair não pude neste engano
(Que é grande dos amantes a cegueira),
Encheram-me, com grandes abondanças,
O peito de desejos e esperanças.”


Na estrofe 55, o gigante conta o episódio de que numa noite, louco de amor e desistindo da guerra, aparece-lhe o lindo rosto de Tétis, única e nua. Como louco, o gigante correu abrindo os braços para aquela que era a vida de seu corpo e começou a beijá-la.


“Já néscio, já da guerra desistindo,
Uma noite, de Dóris prometida,
Me aparece de longe o gesto lindo
Da branca Tétis, única, despida.
Como doudo corri de longe, abrindo
Os braços pera aquela que era a vida
Deste corpo e começo os olhos belos
A lhe beijar, as faces e os cabelos.”


Na estrofe 56, o gigante expressa a profunda mágoa que sentiu, quando acordou e percebeu que a bela Tétis de seu sonho, era na verdade uma rocha, à qual ele se encontrava agarrado. Sentiu-se como uma rocha, diante de outra.


“Oh! Que não sei de nojo como o conte!
Que, crendo ter nos braços quem amava,
Abraçado me achei cum duro monte
De áspero mato e de espessura brava.
Estando cum penedo fronte a fronte,
Que eu polo rosto angélico apertava,
Não fiquei homem, não; mas mudo e quedo
E junto dum penedo outro penedo!”


Já na estrofe 57, Adamastor invoca Tétis, perguntando porque, se ela não amava, não o manteve com a ilusão de abraçá-la. Dali ele partiu quase louco pela mágoa e pela desonra procurando outro lugar em que não houvesse quem risse de sua tristeza.


“Ó Ninfa, a mais fermosa do Oceano,
Já que minha presença não te agrada,
Que te custava ter-me neste engano,
Ou fosse monte, nuvem, sonho ou nada?
Daqui me parto, irado e quase insano
Da mágoa e da desonra ali passada,
A buscar outro mundo, onde não visse
Quem de meu pranto e de meu mal se risse.”


Na estrofe 58 Adamastor conta que os Titãs já haviam sido vencidos e soterrados, para garantir a segurança dos deuses (aqueles contra quem não é possível lutar), e então anuncia o seu triste destino.

“Eram já neste tempo meus Irmãos
Vencidos e em miséria extrema postos,
E, por mais segurar-se Deuses vãos,
Alguns a vários montes sotopostos.
E, como contra o Céu não valem mãos,
Eu, que chorando andava meus desgostos,
Comecei a sentir do fado imigo,
Por meus atrevimentos, o castigo:”


A estrofe 59 conta a dor que o gigante passou e continua a passar. Conta-se que a sua carne se transformou em terra, e os ossos em pedra,e que sua figura se alongou pelo mar até ele se transformar num cabo, criado pelos deuses. Para que seu sofrimento se torne ainda maior, Tétis, seu amor, costuma banhar-se em águas próximas.

“Converte-se-me a carne em terra dura;
Em penedos os ossos se fizeram;
Estes membros que vês e esta figura
Por estas longas águas se estenderam;
Enfim, minha grandíssima estatura
Neste remoto Cabo converteram
Os Deuses; e, por mais dobradas mágoas,
Me anda Tétis cercando destas águas.”



Estrofe 60 (Epílogo)

Na estrofe 60 (última do canto) o gigante desaparece chorando e o mar soa longínquo. Vasco da Gama ergue os braços ao céu e pede aos anjos que os casos futuros contados por Adamastor não se realizem.

“Assi contava; e, cum medonho choro,
Súbito d’ante os olhos se apartou.
Desfez-se a nuvem negra e cum sonoro
Bramido muito longe o mar soou.
Eu, levantando as mãos ao santo coro
Dos Anjos, que tão longe nos guiou,
A Deus pedi que removesse os duros
Casos que Adamastor contou futuros.”


Equipe: Isis Gomes
César Leite
Yasmin Duca
Ana Raquel Pinchemel
Ana Paula Silva Públio

Bibliografia da equipe:http://www.marportugues.hpg.ig.com.br/lusiadas4.htm

http://www.notapositiva.com/trab_estudantes/trab_estudantes/portugues/10adamastor.htm

http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/o/os_lusiadas_o_gigante_adamastor

Um comentário:

  1. Galerinha, arrasaram! Gostei demais da fidelidade do grupo na realização da análise da obra solicitada. Boa interpretação, própria do aluno do ensino médio. Bem sacadas as linhas e entrelinhas das longas estrofes desse canto. Adorei relê-los e compreendê-los. Vocês atingiram o objetivo. Abraços, a pró.

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